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SÃO PAULO â Sem perspectiva de trégua da inflação ou de uma melhora das contas do governo, pelo menos no curto prazo, o mercado vem prevendo altas sucessivas para a taxa básica de juros â a Selic â e cortando projeções para o crescimento da economia brasileira.
Embora possa corroer parte dos ganhos dos investimentos não atrelados a Ãndices de preço, o avanço acima do esperado da inflação e da Selic voltou a deixar algumas aplicações de renda fixa atrativas. E mais: para analistas ouvidos pelo InfoMoney, a forte subida recente dos juros abriu espaço para estratégias mais sofisticadas, como a compra de tÃtulos públicos ou papéis emitidos por empresas atrelados à inflação, com o objetivo de vendê-los antes do vencimento para obter ganhos “turbinados”.
A lógica é a seguinte: quem investe em papéis de renda fixa e os mantém até a data do vencimento leva a taxa de juros prometida no momento da compra. Se, no entanto, vender os tÃtulos no meio do caminho, precisará negociá-los a preço de mercado â que pode ser maior ou menor do que o valor desembolsado no momento do investimento. Portanto, ao fazer uma venda antecipada, o investidor tanto pode obter ganho quanto acabar tendo um prejuÃzo.
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Na prática, a taxa de juros oferecida por um tÃtulo de renda fixa tem uma relação inversa com o seu valor de negociação no mercado. Quando as taxas sobem, como tem sido o caso ao longo deste ano, seu preço tende a cair. à por isso que o preço de um tÃtulo como o Tesouro IPCA+, com vencimento em 2045, por exemplo, desvalorizou mais de 20% desde janeiro até esta terça-feira (21).
Mas o contrário também é verdadeiro. O investidor que comprou um papel de renda fixa a uma taxa mais alta no passado pode ter a chance de vendê-lo no futuro por um preço maior e obter ganhos de capital, caso as taxas oferecidas por aquele tÃtulo no momento da venda estejam mais baixas. O preço do mesmo Tesouro IPCA+ 2045, por exemplo, valorizou 58% ao longo do ano de 2019, quando os juros apresentavam tendência de queda.
à de olho nesse tipo de movimento que os especialistas estão atentos agora. Rodrigo Marcatti, sócio-fundador da Veedha Investimentos, pontua que as taxas de juros aumentaram muito, tanto nos papéis com vencimentos curtos quanto nos mais longos. Logo, se o cenário melhorar um pouco e as taxas dos tÃtulos mais longos voltarem para patamares de quatro meses atrás, o investidor possivelmente conseguiria vendê-los com ganhos de 20% a 30%, dependendo do papel.
A estratégia, no entanto, não é voltada para todos os investidores. Especialistas apontam que para quem está mais acostumado com volatilidade, o momento é oportuno para comprar tÃtulos públicos de curto prazo e médio prazo, com vencimento até 2035, e de longo prazo, entre 2045 e 2055, com foco na venda antecipada.
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“Para investidores mais conservadores, a sugestão é preferir prazos mais curtos, com vencimento até 2026, por não estarem acostumados com forte volatilidade”, diz Flavio Byron, da Guelt Investimentos. “Já para pessoas com perfil mais moderado, a recomendação é preferir prazos intermediários, como 2030 e 2035. Quem tem perfil mais agressivo pode optar por investimentos com horizonte de maior prazo, a partir de 2040, por exemplo”, sugere.
As oportunidades não estão restritas apenas a tÃtulos públicos. Segundo os especialistas, há opções interessantes também entre tÃtulos privados e isentos de Imposto de Renda, como as debêntures incentivadas, Certificados de RecebÃveis Imobiliários (CRIs) e do Agronegócio (CRAs). O investidor, contudo, precisa ter maior atenção, porque esses papéis têm liquidez menor do que os tÃtulos públicos, o que pode tornar mais difÃcil a negociação antes do vencimento.
O que causa o estresse nos juros?
As preocupações com a aproximação de um cenário eleitoral cada vez mais centrado em dois candidatos à presidência da República, aliadas a pressões inflacionárias que devem seguir até o ano que vem, discussões em torno dos precatórios e demora de reformas importantes têm efeito direto sobre o mercado de juros.
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Em momentos de maior incerteza na economia local ou internacional, diante dos riscos, os investidores passam a exigir remunerações maiores para emprestar dinheiro ao governo ou para empresas. Um exemplo claro disso pode ser visto na alta das taxas de alguns tÃtulos públicos.
Segundo informações do site do Tesouro Direto, em 20 de julho deste ano, por exemplo, o Tesouro IPCA+ com vencimento em 2055 e pagamento de juros semestrais oferecia retorno real de 4,27%. Um mês depois, em 19 de agosto, o mesmo papel chegou a pagar juro real de 5,00%.
Cenário favorável para renda fixa
Marcatti, da Veedha Investimentos, acredita que o cenário no curto prazo ainda deve ser de inflação persistentemente alta e de juros avançando. “Se o governo caminhar por esse lado de acelerar gastos e auxÃlios pra garantir uma popularidade mais alta nos próximos meses e ano, nós podemos ter um cenário de inflação mais pressionada. Isso vai obrigar o BC a ‘aumentar a pernada’, o ciclo de alta de juros”, destaca.
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A recomendação, diz Marcatti, é que a estratégia de venda antecipada de papéis de renda fixa seja priorizada por investidores acostumados com fortes oscilações e horizontes de investimento mais longos. “à um movimento mais especulativo. O investidor deve ir carregando o tÃtulo até que haja uma saÃda. Uma hora, a taxa fecha [cai]. A inflação recua, as taxas convergem e a pessoa vende”.
A razão, segundo ele, é que os tÃtulos de longo prazo estão bastante pressionados por causa da questão fiscal e dos ruÃdos polÃticos. “Mesmo que a inflação continue mais alta, se o governo se comprometer com o teto, com o orçamento e resolver a questão dos precatórios, já terÃamos uma diminuição do risco-paÃs e os juros mais longos tendem a fechar mais rápido”.
Após esse perÃodo de maior aperto monetário, no entanto, a tendência é de que a inflação seja controlada e os juros voltem a desacelerar para não prejudicar a atividade econômica, afirma Marcatti. “Assim como ocorre normalmente, a inflação vem e o Banco Central sobe os juros. Os efeitos aparecem na economia, a inflação desacelera e busca-se um juro neutro, um equilÃbrio em que não se gere inflação”.
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Embora a alta da Selic também seja positiva para ativos atrelados ao Certificado de Depósito Interbancário (CDI), a preferência é por tÃtulos atrelados à inflação.
O motivo, segundo Mateus Caldasso, head de renda fixa na Alta Vista Investimentos, é que os juros devem subir, mas não devem se manter em patamar muito alto, já que a atividade econômica está devagar e o desemprego, alto. Logo, a alocação em tÃtulos atrelados à inflação é uma forma de se proteger da perda de poder aquisitivo e de obter ganhos reais.
A situação não é nova. Marcatti explica que não é a primeira vez que investe em tÃtulos atrelados à inflação com foco em ter uma posição tática. “Em abril de 2020, em plena crise de coronavÃrus, quando todos estavam resgatando, as taxas de juros subiram muito e aumentamos a alocação em NTN-Bs [Tesouro IPCA+]. Quando chegou em julho, saÃmos da posição porque houve uma queda que achamos interessante”, destaca.
Como começar?
Investir em renda fixa com foco em vendas antecipadas exige atenção, porque a oscilação de preços pode ser expressiva. “Esse tipo de investimento é de alta volatilidade. Se pegarmos a curva dos últimos anos de uma NTN-B [Tesouro IPCA +] longa e compararmos com o gráfico da bolsa, é possÃvel perceber que as oscilações são muito parecidas”, destaca Byron, da Guelt Investimentos.
Ainda que a volatilidade seja uma caracterÃstica desse tipo de mercado, o sócio da Guelt argumenta que a vantagem de adquirir tÃtulos atrelados à inflação é que, caso o mercado não melhore, o tÃtulo já teria uma remuneração interessante se estivesse em algo como 5% ao ano mais a variação do IPCA, mesmo sem fazer uma venda antecipada.
Como a estratégia é mais agressiva, a recomendação dos especialistas é para que o investidor esteja disposto a realizar movimentos “especulativos” no mercado, comprando mais papéis aos poucos.
“O melhor é ir fracionando a entrada. à muito difÃcil acertar o timing [a melhor hora]. à possÃvel comprar ao longo de duas ou três semanas, a não ser que haja um dia de muito estresse, que valha entrar com mais força”, diz Byron.
Oportunidades na renda fixa privada
Ainda que o mercado de tÃtulos públicos tenha um volume maior de negociações, o que facilita a venda antecipada, há quem também veja boas oportunidades para adquirir papéis de crédito privado, indexados à inflação e com isenção tributária, como debêntures incentivadas, Certificados de RecebÃveis Imobiliários (CRIs) e do Agronegócio (CRAs).
A estratégia seria a mesma: vendê-los antecipadamente na tentativa de obter ganhos de capital. A razão é que a alta das taxas também foi sentida no mercado de crédito privado.
Um levantamento das taxas oferecidas por alguns tÃtulos privados oferecidos na plataforma da XP nesta segunda-feira (20), por exemplo, mostrou que havia CRAs e CRIs, com classificação de risco AAA, oferecendo taxas reais a partir de 4,9% ao ano.

Entre as opções estavam os CRAs da Minerva, com classificação de risco AAA, vencimento em 2031 e taxa real de 4,95% ao ano. Outra opção era o CRI da MRV, com vencimento no mesmo ano e retorno real de 4,9%, também com rating AAA.
Apenas como base de comparação, em abril deste ano, era possÃvel encontrar CRAs da Minerva, com vencimento em 2025, oferecendo juro real de 2,8% ao ano. Ou um CRA da JBS com vencimento em 2030 e taxa de 4% ao ano.
Ao olhar para esses tÃtulos, o sócio da Guelt diz que prefere aqueles que pagam IPCA mais 4% ao ano, com vencimento até 2035 e classificação de risco AAA â a melhor do mercado. “A maioria dos clientes tem perfil moderado e preferimos prazos intermediários. Hoje, há papéis da Eletrobras, Petrobras e JBS que gostamos. O mercado primário tem lançado boas opções”.
Já Samuel Cunha, da H3 Invest, afirma que sua preferência é por tÃtulos com vencimento entre 2026 e 2030, nos quais é possÃvel encontrar taxas mais atrativas em relação à s dos tÃtulos públicos. Em prazos mais alongados, segundo ele, é preferÃvel que o investidor opte por papéis emitidos pelo governo, porque a remuneração é mais interessante.
Quais são os riscos?
O movimento de adquirir tÃtulos numa taxa maior e se desfazer deles no curto ou médio prazos tem como premissa um cenário de melhora no risco polÃtico e fiscal.
Samuel Cunha, da H3 Invest, destaca que o mercado precisa ver progresso na comunicação dos poderes, no avanço de reformas desejadas pelos agentes financeiros, como a administrativa, além de uma solução para o problema dos precatórios. à nessas condições que as taxas podem a ficar em nÃveis mais baixos, proporcionando ganho de capital numa venda antecipada.
Se houver mais turbulência e nenhum avanço nas reformas, segundo Cunha, a estratégia de venda antecipada pode não ter sucesso e o investidor pode se prejudicar. Se precisar sair e as taxas tiverem subido ainda mais, é possÃvel que acabe tendo prejuÃzo.
Especificamente sobre os papéis de crédito privado, embora as oportunidades existam, o investidor precisa ter consciência de que debêntures, CRIs e CRAs não têm a garantia do Fundo Garantidor de Crédito (FGC).
à preciso, portanto, olhar com bastante atenção a qualidade do crédito oferecido pelo emissor. O ideal, segundo os especialistas, é buscar empresas com boa classificação de crédito, preferencialmente entre AAA e A+.
Byron também pondera que o mercado privado não tem a mesma liquidez do que o de tÃtulos públicos e que o investidor precisa ficar atento, se precisar sair antes da hora. “O risco do crédito privado é precisar sair no olho do furacão. Se precisar vender no Tesouro, o investidor tem facilidade de encontrar comprador. Porém, no mercado de crédito privado, nem sempre é possÃvel”, destaca.
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