Reabertura chinesa e problemas do lado da oferta deixam especialistas otimistas com petróleo e minério em 2023

Para o setor de papel e celulose, porém, aumento de produção é visto como empecilho para uma melhora dos preços

Vitor Azevedo

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Após as commodities terem recuado por boa parte do segundo semestre de 2022, nos dois últimos meses do ano passado os principais produtos não manufaturados vêm em uma tendência de alta. A tonelada do minério de ferro foi negociada a cerca de US$ 92,20 em novembro último e agora está em mais de US$ 120. O barril de petróleo Brent, que chegou a ser negociado a US$ 76 em seu pior momento, em dezembro, agora está a US$ 86,55.

E, por enquanto, especialistas aparentam estar otimistas para a performance dessas duas mercadorias em 2023, vendo mais sinais das commodities para cima do que para baixo.

Em comum entre as variáveis que ajudam a deixar o preço de ambas mais cara – e com potencial de ir além – está a China.

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“No final do ano passado, o mercado chinês estava muito fechado por conta dos lockdowns e das restrições impostas para frear os contágios de Covid-19”, lembra Paulo Azevedo, analista de research minério de ferro da Wood Mackenzie. “A expectativa era que o retorno [às atividades normais], as flexibilizações, iriam acontecer de forma mais gradual, principalmente a partir do segundo trimestre deste ano, mas, aparentemente, os governantes decidiram acelerar esse processo”.

Em grande parte, é o processo de reabertura do gigante asiático que puxou recentemente os preços para cima, tanto do minério quanto do petróleo, e que mantém as perspectivas otimistas para as commodities ao longo deste ano.

Minério é destaque com China

“Quanto ao minério, as perspectivas para os níveis de preço no ano, em relação ao que vimos no segundo semestre de 2022, são boas. A China é responsável pelo consumo de quase 70% da produção mundial dessa commodity e o seu governo está buscando acelerar o crescimento econômico, sinalizando estímulos e lançando pacotes no setor de infraestrutura”, complementa o especialista da Woodmac.

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Apesar de ter surpreendido positivamente no quarto trimestre, a China teve um 2022 mais fraco, com crescimento de apenas 3%, o que é pouco para os seus padrões, por conta da Covid-19.

Para 2023, porém, o governo de Pequim fixou a meta de um crescimento de ao menos 5% ao ano – e parece estar disposto em alcançá-la.

“Como um possível trigger [catalisador] negativo ficaria a questão da Covid-19. Nós, contudo, vemos as restrições ficando no passado. A China está buscando imunidade de rebanho, deixando as pessoas mais livres. A própria população não aguenta mais os lockdowns”, debate Paulo Azevedo. “Parece que o pico das restrições foi em dezembro. O tráfego de pessoas tem aumentado bastante e a demanda, também”.

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A projeção da Woodmac para a tonelada de minério em 2023 é de US$ 100.

No caso do petróleo, a China é o segundo maior consumidor mundial desse produto no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. A retomada do país também puxou o valor da commodity e deve continuar ajudando a manter o preço do barril afastado das mínimas recentes.

Mas a dinâmica no caso desse produto, justamente pelo fato de o consumo ser menos centralizado.

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Com a possibilidade de recessão ainda no horizonte de vários países, em meio a diversos bancos centrais aumentando suas taxas de juros, o preço do petróleo tem, consideravelmente, assimetrias maiores para o lado de queda do que o minério.

“A princípio, os problemas que nós tivemos no ano passado, como a guerra da Ucrânia, foram parcialmente remediados. Tivemos um grande redirecionamento do fluxo de petróleo no mundo. O petróleo russo ao invés de seguir para a Europa está indo para o Oriente, reorganizando a cadeia. Isso traz uma certa estabilidade para os preços quanto a altas”, explica Marcelo de Assis, diretor de research em petróleo da Woodmac.

De acordo com ele, o que fica em destaque quando o assunto é preço do petróleo é a atividade econômica global, principalmente nos Estados Unidos e na União Europeia.

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Petróleo tem risco maior com recessão, mas restrição de oferta é contraponto

“Nós acompanhamos de perto a questão dos bancos centrais porque, se continuarmos com uma trajetória de juros altos, a tendência é uma retração da atividade econômica”, debate Assis. “Se tivermos uma recessão, ou um princípio de recessão, temos mais gente desempregada, menos gente viajando, consumo caindo e por ai vai”.

Fica mais fácil, então, entender as oscilações do petróleo recentes. Se a inflação nos Estados Unidos e na Europa dá sinais de arrefecimento, com menor necessidade das autoridades monetárias subirem o juros de forma mais agressiva, o petróleo avança. Se os preços sinalizam altas além do esperado, o preço do Brent tende a cair.

A projeção da Woodmac para o preço do petróleo Brent em 2023, embora os riscos, é de US$ 90 o barril.

Apesar de a menor atividade econômica, oriunda da alta dos juros e da inflação, ameaçar derrubar o preço do petróleo, o lado da oferta é um contraponto a esse problema.

“Do lado da Organização dos Países Produtores de Petróleo (Opep), não esperamos grandes cortes ou grandes aumentos de produção. Fora dela, também não. Do lado da oferta, a inflação mais alta implicou também no fato de as grandes petroleiras estarem com uma maior disciplina de capital. A cadeia de suprimento mais cara inflou os custos dos investimentos”, explica o diretor da Woodmac.

Para além da inflação, as incertezas econômicas recentes, em meio à questão da Covid-19, também foram responsáveis por minguar os investimentos no setor de extração de petróleo. Além disso, especialistas já vêm apontando, há algum tempo, que o fortalecimento da pauta de transição energética também traz resultados nesta frente.

A combinação desses fatores diminuiu a possibilidade de grandes crescimentos da oferta mundial de petróleo e, decorrentemente, traz assimetria de alta para o preço.

Em relatório publicado em dezembro, o Goldman Sachs definiu que 2023 será o ano no qual o subinvestimento em commodities “irá morder” o mercado.

“De uma perspectiva fundamental, a configuração para a maioria commodities no próximo ano é mais otimista do que em qualquer momento desde que destacou o superciclo pela primeira vez em outubro de 2020”, comenta a instituição financeira americana. “Apesar dos estoques e da capacidade ociosa amplamente esgotados na maioria dos mercados, o capital em 2022 provou não responder a preços quase recordes, pois o posicionamento do mercado permaneceu distorcido para uma recessão. A maior parte da deflação das commodities veio de banqueiros centrais aumentando o custo de capital e drenando a liquidez do mercado”.

Algo parecido, por fim, acontece também com o minério de ferro – mas não exatamente pela falta de investimento em novas plantas de extração.

“Tivemos recentemente uma tempestade perfeita, com baixa da oferta, com sazonalidade de menor produção e menores embarques aqui no Brasil por conta do período chuvoso, e retomada da demanda, principalmente por conta do pré-ano novo chinês, que é marcado, usualmente, por uma estocagem maior de minério”, contextualiza Azevedo. “Olhando além do curto prazo, a própria Vale colocou os pés no chão quando o assunto é aumento de produção produção, tirando seu guidance de produção dos próximos anos das 400 milhões de toneladas e o colocando mais para baixo, com licenciamentos mais complicados”.

A Vale (VALE3) é a segunda maior produtora do mundo de minério e abaixou consideravelmente as suas expectativas de aumentar a produção da commodity. A movimentação da mineradora brasileira, então, também ajuda a manter as expectativas para o preço do minério otimistas.

Gestores estão otimistas com commodities

O otimismo com as commodities se estende também para gestores e analistas do mercado financeiro.

“Preferimos commodities a outros ativos, além da renda fixa e variável, mas com uma visão cautelosa e cada vez mais ligada à possível reabertura da China”, comenta Andres Castro, Portfolio Manager da Global X ETFs Brasil. “Uma desaceleração econômica global é um fator de risco para as perspectivas de commodities focadas no crescimento econômico. No entanto, as commodities devem se beneficiar de uma possível mudança da força do dólar”.

No caso de quem se expõe a produtos não manufaturados através de companhias brasileiras, especialistas destacam que a própria possibilidade de recessão acaba por aumentar a lucratividade das empresas.

Apesar da possibilidade do recuo do preço das commodities, nesse cenário há, usualmente, um fortalecimento do dólar, o que melhora margens, trazendo certa segurança – investidores, quando a economia mundial recua, tendem a correr para a moeda americana buscando segurança.

“Após um ano de riscos geopolíticos significativamente elevados, 2023 pode trazer um retorno a mercados mais normais, impulsionados pela economia e não pela geopolítica. A inflação global pode cair acentuadamente em meio a efeitos de base mais baixos, devido à queda nos preços do petróleo e das commodities, juntamente com a desaceleração da economia global”, diz Castro.

A guerra na Ucrânia, no primeiro semestre de 2022, impulsionou o preço do petróleo e do minério. Os dois países envolvidos são produtores relevantes das duas commodities e o conflito, obviamente, atrapalhou o andamento normal das coisas.

Mas, a despeito de as duas commodities terem se afastado das máximas do ano passado, os preços nos patamares atuais ainda são atraentes.

“Estamos otimistas com commodities. Pegamos essa primeira surfada de minério, com a volta da China e acreditamos que ainda há um efeito de demanda reprimida por lá. As famílias ficaram dois anos sem viajarem, sem consumirem, por conta das restrições”, diz Pedro de Marco, analista na Reach Capital. “Já o petróleo, nos níveis atuais, está assimétrico. Não deve subir muito, mas se ficar parado no intervalo entre US$ 80 e US$ 90, já gera muito valor para as empresas do setor”.

O Bradesco BBI, em relatório divulgado nesta terça-feira, defende que o minério de ferro é sua commodity favorita para 2023.

“Os preços dos metais estão preparados para um ano saudável à frente, já que a recuperação da atividade econômica chinesa mais do que compensa a fraqueza em outras regiões globais”, debatem os analistas do banco brasileiro. “Projetamos preços médios de US$ 140 a tonelada no primeiro semestre e de, em média, e US$ 130 ao longo do ano”.

Para celulose, perspectivas são diferentes

Se o petróleo e o minério passam, no cenário principal, por uma dinâmica de maior demanda e menor oferta, a celulose não vai no mesmo caminho.

De acordo com um levantamento feito pelo Itaú BBA com o buy side (gestores), esse setor deixou de ser o preferido da maioria recentemente, perdendo espaço para o de mineração. Hoje, 36% desses especialistas têm companhias de papel e celulose como suas favoritas, ante 45% em agosto de 2022, ainda que sendo a segunda maior exposição entre os materiais básicos.

O Goldman Sachs, em relatório, destaca que apesar de a reabertura da China trazer otimismo em relação à demanda, ela, provavelmente, não será suficiente para compensar o recente aumento da oferta dessa commodity e as fraqueza dos pedidos no resto do mundo.

“Adicionalmente, os preços da celulose ainda estão muito acima do custo marginal da média histórica, então vemos um apetite muito limitado para os compradores reabastecerem seus estoques nos níveis atuais”, contextualizam.

O banco americano afirma que compradores aproveitaram os preços mais baixos durante o ano passado para comprarem mais.

Apesar de ter caído 2% em dezembro, o estoque de celulose nos principais portos da China ainda está em 1,6 milhão de toneladas, acima da média normal, que é de 1,4 milhão.

“Diferentemente de alguns participantes do mercado, não acreditamos que os preços da celulose cheguem ao fundo do poço no segundo semestre deste ano (quando as principais novas usinas estarão em plena capacidade), mas acreditamos que os compradores anteciparam a fraqueza e o preço mínimo provavelmente será atingido neste primeiro semestre”, finalizam.

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