IPCA abaixo do esperado mostra melhora consistente da inflação, mas não deve mudar planos do BC para Selic

Analistas consideram cenário positivo para novas reduções de juros, apesar de combustíveis e setor de serviços ainda preocuparem

Camille Bocanegra

(Shutterstock)
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Divulgado na manhã desta quarta (11) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) teve alta de 0,26% em setembro e apresenta avanço de 5,19% no acumulado de 12 meses.

Considerado a inflação oficial do país, o dado veio abaixo da projeção do consenso Refinitiv, que estimava alta de 0,34% no mês e 5,27% no acumulado anual.

“A leitura do IPCA de setembro segue mostrando melhora consistente da inflação, com abertura benigna de núcleos”, considerou o Itaú.

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O Bradesco apresenta a mesma visão e avalia o resultado como “qualitativamente melhor do que o esperado, especialmente nas métricas sensíveis ao ciclo”.  A XP afirmou que os dados mostraram “a segunda fase de desinflação em andamento”.

Na avaliação da maioria dos especialistas, o destaque é o setor de transporte, em especial pela alta da gasolina, que veio com alta de 2,8%. Dos nove grupos e serviços observados na pesquisa divulgada pelo IBGE, seis demonstraram avanços em setembro.

Para o Itaú, no entanto, o destaque foi para “surpresas baixistas em gasolina e alimentação no domicílio”. A gasolina, ainda que tenha puxado o IPCA, ficou abaixo da projeção do Itaú, que era de alta de 3,3%.

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“Outro destaque positivo foi a desaceleração no núcleo, que juntamente com o índice cheio, desacelerou para +0,21% na variação mensal, e +5,0% na variação de 12 meses”, comenta André Fernandes, da A7 Capital.

Apesar de ser o grande responsável pela alta vista em setembro, os preços de combustíveis surpreenderam alguns analistas positivamente, justamente por virem abaixo do esperado. “Os preços da gasolina ficaram abaixo de nossas expectativas (2,8% contra 3,6%), o que significa um menor repasse dos ajustes dos preços da gasolina pela Petrobras em agosto”, comenta a XP.

“Por outro lado, ajudam a explicar o resultado abaixo das expectativas de mercado o desempenho dos grupos de Habitação, Saúde e cuidados pessoais e Alimentação e bebidas”, considera Matheus Pizzani, da CM Capital.

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O segmento de serviços, ainda que tenha apresentado números abaixo do esperado, continua preocupando analistas por seguir em alta, considerando o acumulado dos últimos 12 meses. Em agosto, o setor apresentou alta de 0,08% e, nos dados apresentados hoje, cresceu 0,50%.

Para o Bradesco, o avanço era esperado em função do comportamento de passagens aéreas. É a mesma visão de André Cordeiro, economista-sênior do Inter, que acrescenta que as passagens avançaram 13% em setembro após recuo de 11% em agosto.

“Se desconsiderarmos as passagens aéreas, a inflação de serviços teria sido de 0,30%, em linha com os últimos meses. Com isso, observa-se ainda a continuidade da desaceleração da inflação de serviços subjacentes, que saiu de 5,49% para 5,19% no acumulado dos últimos 12 meses”, ressalta Cordeiro.

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Na análise do Itaú, os núcleos se destacam como abaixo do esperado, tanto serviços subjacentes quanto industriais subjacentes. Isso, para a XP, reforça a tese da segunda fase de desinflação em andamento, destacando que é assim que o Banco Central considera a moderação nos preços de serviços.

Ainda assim, conforme explica Claudia Moreno, economista do C6 Bank, o acumulado de 12 meses ainda se apresenta como elevado demais tanto na inflação de serviços quanto para os núcleos.

“Quando olhamos para o resultado mensal, a inflação de bens industriais, de serviços e núcleos do Banco Central vieram mais baixos do que esperávamos. Mas, com exceção de bens industriais e alimentação, a inflação de serviços e os núcleos do Banco Central continuam rodando em patamares elevados no acumulado de 12 meses”, comenta Claudia.

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Para Laura Moraes, economista da Neo Investimentos, o grande foco de atenção segue a inflação de serviços, ainda que tenha se apresentado em linha com as projeções da Neo.

“Minha leitura é que a quebra de serviços foi um pouco melhor qualitativamente, uma vez que tivemos mais um registro baixo em alimentação fora do domicílio. Essa categoria está surpreendendo pra baixo, uma vez que é bastante correlacionada com o mercado de trabalho que está aquecido”, considera Moraes.

Combustíveis devem seguir puxando inflação

O dado de hoje trouxe viés baixista sobre os próximos dados para a maioria das análises. A equipe econômica do Itaú projeta que o dado fechará em 4,9% ao ano em 2023.

“Nossa projeção de 4,8% possui viés de baixa. Para 2024, nossa expectativa segue em 3,6%”, estima o Bradesco. A projeção da equipe econômica da XP é a mesma para este ano, com manutenção de 4,8% em 2023 e avanço de 3,9% em 2024.

O que poderia causar aumentos para os próximos dados, de acordo com analistas, é justamente o impacto de combustíveis, ainda não totalmente precificado com a guerra entre Israel e o Hamas. Ainda que os preços do petróleo tenham se estabilizado após a alta forte de segunda-feira, ainda é necessário acompanhar o possível impacto.

“Para o próximo mês, os combustíveis devem continuar dando o tom do IPCA. Como o petróleo voltou a subir por conta da guerra, pode haver novos reajustes nos preços da gasolina e diesel pela Petrobrás” diz Fernandes.

É a mesma visão de Pizzani, da CM Capital. “Embora não responda por uma fração muito representativa do indicador, o movimento indica que os combustíveis se mostram atualmente como uma das principais fontes de inflação do país, algo que se torna preocupante quando levado em consideração a conjuntura internacional desafiadora”, comenta.

Para Étore Sanchez, da Ativa Investimentos, os combustíveis apresentaram variação mais baixa nesse momento e poderá aparecer mais nos dados do próximo mês.

“Preliminarmente avaliamos que a variação de gasolina mais baixa do que o antevisto deverá se refletir na projeção de outubro, que ganha viés baixista dos atuais +0,26%”, considera.

Próximos passos do Copom

Na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que acontecerá em 31 de outubro e 1º de novembro, a expectativa é que o regime de cortes de 50 pontos-base se mantenha com o dado divulgado hoje.

“No geral, as medidas subjacentes do IPCA de setembro confirmaram que a segunda fase de desinflação no Brasil está avançando, mas não a ponto de alterar o ritmo de cortes na taxa de juros de 50 pontos-base do BCB para as próximas reuniões”, explica a XP. Na visão da corretora, os eventos internacionais, como Guerra de Israel e a política monetária nos EUA, poderão trazer mais impacto para o Copom.

É a mesma consideração do Goldman Sachs, que entende que a continuação no ciclo gradual de cortes é apoiada pelos preços mais baixos de alimentos, deflação nos preços do atacado e inflação moderada presente.

“No entanto, o espaço para uma aceleração no ritmo dos cortes de taxa no curto prazo é muito limitado”, entende o banco, que destaca ainda que o cenário externo instável, os rendimentos dos Treasuries de 10 anos mais elevados e o risco dos preços do petróleo decorrentes do conflito no Oriente Médio são pontos de atenção para a continuidade da política monetária.

Para o banco, o espaço para aceleração no ritmo dos cortes de taxa é muito limitado. Mesma visão da corretora Eleven, que considera que “a análise quantitativa da divulgação não parece suficiente para aceleração”.

“Com a inflação mostrando arrefecimento, esperamos que o Copom siga com cortes de 0,50% nas próximas reuniões e esse patamar de cortes não deve aumentar por enquanto devido à incerteza global. Há de se observar também como vai vir o dado de inflação oficial nos EUA amanhã, quando nosso mercado estará fechado”, diz Fernandes.

Na mesma linha, economista da Rio Bravo, Luca Mercadante, aponta não esperar mudanças para a condução da política monetária neste ano, com a taxa Selic encerrando 2023 a 11,75%. “Mesmo sem mudanças de perspectiva o dado foi bom, a melhora na difusão também reforça a ideia de que a desinflação é lenta, mas está ocorrendo”, aponta.