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Um dos criadores da cadeia produtiva do etanol, Maurilio Biagi Filho, é um entusiasta do biocombustível. Nos anos 1970, ele participou das negociações com o governo que culminaram na criação do Programa Nacional do Álcool (Proálcool). No início, as usinas tradicionais não se interessaram pelo projeto que deu origem ao etanol brasileiro e influenciou a expansão do biocombustível no mundo inteiro. Biagi, ao contrário, foi um visionário. Vindo de uma família de agricultores, levou a usina Santa Elisa, da família, da moagem de 118 mil toneladas até 7 milhões de toneladas por safra. Nos anos 1990, chegou a liderar o ranking do setor.
Chairman do LIDE Ribeirão Preto, atualmente Biagi se dedica a estimular iniciativas no campo e afirma que a agricultura pode ser maior do que é. “O produtor brasileiro é muito determinado e tem um objetivo claro. Faz o melhor possível.” Ele também ressalta o potencial do agronegócio brasileiro, que tem crescido devido ao aumento de produtividade. “O Brasil terá um futuro extraordinário na área agrícola”, acredita. Ele não poupa elogios a novos empresários, como Leontino Balbo Júnior, da Native, que investe em produção sustentável e limpa e se tornou o maior produtor de açúcar orgânico do mundo.
Biagi conhece intimamente o segmento, desde que o engenheiro Lamartine Navarro Júnior (1932-2001) apresentou a várias autoridades o estudo Fotossíntese como Fonte de Energia, há mais de 40 anos. “Quando implantamos o Proálcool, todas as autoridades energéticas do mundo vieram conhecer o que estávamos fazendo”, diz. Mesmo tendo uma atuação indireta no mercado – não é mais proprietário de usina, e preside o Grupo Maubisa, que administra diversos negócios da família –, é um porta-voz independente do segmento sucroalcooleiro, que ajudou a moldar. Esteve à frente das usinas MB, Cevasa e Moema, entre outras. Agora, no entanto, é o milho que desperta sua atenção.
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O empresário elogia o pioneirismo do ministro da Agricultura, Mauro Blaggi, incentivador da produção de etanol de milho quando governou o Mato Grosso, de 2003 a 2010. O estado hoje abriga usinas flex (que produzem etanol de cana e também de milho), e sedia desde 2017 a primeira planta 100% dedicada ao biocombustível de milho do país.
Aos 76 anos, o empresário continua apostando no potencial do álcool, mas não deixa de ressaltar as oportunidades perdidas. “Quando os Estados Unidos começaram, já tínhamos uma indústria desenvolvida. Hoje, eles produzem 60 bilhões de litros, o dobro do Brasil. Vieram aqui, acharam nossa tecnologia muito boa e adaptaram.” No caso do milho, Biagi ressalta que o país pode desenvolver uma produção mais eficiente. “O Brasil já devia ter adotado esse know how, fazendo melhor que os americanos. Eles produzem um álcool de milho que a gente chama de sujo. Tem traços de petróleo, usado para o processamento.” Como o milho não gera biomassa para fornecer a energia necessária, aqui pode-se aproveitar o bagaço de cana para esse fim, vantagem competitiva que eles não têm. Além disso, é possível aproveitar o período da entressafra da cana para o processamento do milho, aumentando a produtividade. O cereal também pode ser consumido localmente, evitando os excedentes e regulando o mercado.
De acordo com Biagi, os Estados Unidos regulam a produção do combustível de uma forma mais inteligente – com um modelo técnico, político e econômico que inclui subsídios quando necessário –, e isso levou o país à posição de liderança. Também critica a produção do álcool em duas composições: anidro e hidratado. Para ele, desde o início o Brasil deveria ter padronizado o biocombustível apenas com etanol anidro, que permite eficiência maior dos motores a combustão, por não ter água. Outra de suas bandeiras era a utilização da biomassa para a geração de energia. Nos anos 1990, havia publicado um artigo em que apontava haver “uma Itaipu adormecida nos canaviais”. Hoje, a geração de energia com o bagaço de cana virou realidade. “Quando eu comecei a trabalhar, não havia nenhuma variedade de cana brasileira, era tudo importado e adaptado. Hoje, todas são selecionadas e desenvolvidas aqui.” Mesmo assim, considera os investimentos em pesquisa insuficientes. “Quando o assunto é cana – -de-açúcar, nós estamos estaciona – dos tecnologicamente há dez anos.”
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O destino da produção brasileira, segundo Biagi, está nas mãos dos próprios empresários. Ele evita culpar o Estado por ações que deveriam partir do próprio setor. A começar do empenho insuficiente em convencer todos da importância do combustível verde para o país e a sociedade. “É uma crítica que faço a mim mesmo. O segmento precisa se vender melhor.” Para ele, quem desenvolveu historicamente a cadeia do álcool foram as companhias fornecedoras de equipamentos e as montadoras, ao apostarem nos carros movidos a etanol para superar momentos de crise. A mesma situação ocorreu na criação dos motores flex, nos anos 2000. “Foi a indústria automobilística que desenvolveu, para vender carros”, afirma.
TRAJETÓRIA DE SUCESSO
Outra área importante de atuação de Biagi foi o segmento de bebidas. Nos anos 1980, como CEO da Refrescos Ipiranga, envasadora da Coca-Cola, foi um dos responsáveis pela implantação de suco e depois de cerveja para a companhia americana. Tornou-se o primeiro brasileiro a integrar o Board Internacional da multinacional. Para expandir a atuação e enfrentar a estratégia de venda casada da concorrência – de refrigerante e cerveja –, convenceu a fábrica americana a comercializar também bebidas alcoólicas, o que era vetado pelo contrato. Com isso adquiriu, na época, a cervejaria Inglesinha, de Mogi Mirim. A parceria inédita acabaria sendo o embrião da Kaiser SP. Biagi teve ainda importante papel na indústria de transformação, como fornecedor de equipamentos pesados para usinas agrícolas e também para refinarias da Petrobras. Nesse setor, liderou empresas como a Zanini Equipamentos Pesados, Zanini Renk, AKZ Turbinas e Sermatec.
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Com sua atuação privilegiada, Biagi tornou-se uma voz importante na formulação de políticas públicas. Foi membro por 12 anos do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República (CDES), o chamado “conselhão”. Também teve grande atuação em entidades de classe como o Conselho Empresarial da América Latina (Ceal) e a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).