Na mira da CPI das pirâmides, empresa enganou 45 mil pessoas ao prometer ganho de 15% ao mês com cripto

Negócio fraudulento fundado em 2018 deixou prejuízo financeiro de ao menos R$ 1 bilhão

Lucas Gabriel Marins

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A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das pirâmides financeiras de criptomoedas, autorizada na semana passada na Câmara dos Deputados, investigará três empresas suspeitas de aplicar golpes em investidores. Uma delas é a Zero10 Club, que passou a usar apenas o nome Genbit antes de ruir há pouco mais de dois anos.

A empresa, fundada por Nivaldo Gonzaga dos Santos, Gabriel Barbosa e Dani Oliveira, é acusada de enganar pelo menos 45 mil pessoas, deixando um prejuízo financeiro de ao menos R$ 1 bilhão.

A história renderia um filme e começou em 2018, quando o trio montou um suposto conglomerado cripto, com dezenas de CNPJs. Por meio do negócio, eles começaram oferecer supostos pacotes de investimento atrelados a criptoativos, com promessas mirabolantes de rendimentos fixos de 15% ao mês.

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No mercado cripto, conhecido por sua extrema volatilidade, esse tipo de garantia é um sinal de alerta, segundo especialistas.

O esquema

Para atrair as pessoas, segundo o Ministério Público de São Paulo, Santos e seus sócios promoviam encontros regados a bebidas finas. Eles também costumavam divulgar fotos em audiências com autoridades do Banco Central, para dar ar de seriedade ao esquema, assim como fazia Bernard Madoff, criador da maior fraude financeira dos Estados Unidos — antes de ser descoberto, vivia entrosado com membros do governo.

O esquema todo também contou com apoio de religiosos e “coachs”, que usavam o dom da oratória e do convencimento para captar investidores em todo o Brasil. A Genbit tinha ainda diversos “líderes” — como eram chamados os integrantes do esquema que ajudavam a angariar novos membros — em cidades como Curitiba (PR) e Campinas (SP), sede do esquema.

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Em março de 2019, após receber denúncias de investidores, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) divulgou um alerta ao mercado comunicando que a Zero10 Club e seus membros não estavam “habilitados a ofertar publicamente títulos ou contratos de investimento coletivo relacionados à oportunidade de investimento relacionada a cotas empresariais”.

Como a empresa continuou em operação, por meio do CNPJ da Genbit, a CVM soltou um novo alerta naquele mesmo ano, e um processo administrativo sancionador foi aberto.

Criptomoeda criada “do nada”

Àquela altura, a Genbit já não pagava mais os investidores. No final de 2019, em uma jogada que enfureceu os clientes e surpreendeu o mercado cripto brasileiro, a empresa decidiu que, em vez de pagar os credores com dinheiro ou criptomoedas conhecidas, como o Bitcoin (BTC), adotaria uma moeda digital nova criada pela própria empresa: o Treep Token (TPK). O suposto ativo digital, no entanto, era falso, nunca valeu nada, nem chegou a ser listado em nenhuma exchange do mercado.

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Em meio à falta de pagamentos e aos comunicados da CVM, no final de 2019, o Ministério Público de São Paulo ajuizou uma ação civil pública contra o grupo e seus integrantes, pedindo o ressarcimento dos valores e o bloqueio dos ativos. No início de 2020, a Justiça autorizou o bloqueio de R$ 800 milhões das contas da empresa e dos envolvidos. Era tarde demais: menos de R$ 2 mil foram encontrados. O processo segue em andamento.

“Ainda não se descarta a possibilidade de continuarmos atrás de bens não só da empresa, mas de possíveis ‘laranjas’ que detenham o patrimônio total dos proprietários da Zero10 Club”, disse a advogada Daniela Panzonatto, que representa mais de 100 vítimas da Genbit dentro do processo movido pelo MP.

Nesse meio tempo, pelo menos 1.500 processos civis em todo o Brasil foram impetrados contra a empresa, segundo a plataforma Jusbrasil. Apesar de algumas decisões favoráveis, praticamente a totalidade das vítimas não conseguiu reaver os recursos.

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Além disso, Santos e os demais envolvidos sumiram do mapa. No processo do MP, os advogados deles tentaram suspender a ação, mas a Justiça negou o pedido.

No final de 2022, a CVM condenou a empresa e Gabriel Barbosa a pagarem uma multa de quase R$ 2 milhões. Além do órgão regulador e do MP, a Polícia Federal (PF) de Campinas está investigando o caso, que segue em segredo de Justiça. Contatada, a PF disse que não se manifesta sobre investigação em andamento.

A reportagem tentou contato com os advogados da Genbit por telefone, sem sucesso.

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CPI das pirâmides

A comissão parlamentar focada nas pirâmides de criptomoedas, aprovada na semana passada, terá prazo de 120 dias, prorrogável por até 60 dias, para investigar as firmas e as pessoas físicas responsáveis pelos esquemas. Além da Genbit, as empresas Atlas Quantum e Trader Group entraram na mira dos deputados.

De acordo com Artêmio Picanço, advogado especialista em blockchain, esse é um assunto urgente, visto que nos últimos quatro anos as pirâmides com cripto causaram perdas de pelos menos R$ 40 bi a 4 milhões de brasileiros.

“É um tema extremamente sensível hoje e precisa de amparo de todos os entes de persecução que existem, no caso os parlamentares por meio da CPI e demais órgãos de fiscalização que estão envolvidos nesse tipo de demanda, além do apoio da sociedade”.

Ainda segundo Picanço, que deve ir a Brasília para discutir o tema com o relator da CPI, a comissão tem poderes de requisições que, caso forem descumpridos, podem acarretar até em pedidos de prisão. “Essa é uma parte muito boa para casos que estão dormentes na Justiça e que não tiveram nenhum desdobramento da esfera criminal ainda”, disse.

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Lucas Gabriel Marins

Jornalista colaborador do InfoMoney