Debate presidencial na Argentina pegou fogo com temas econômicos

Entre os temas, candidatos debateram propostas de dolarização e a relação da Argentina com parceiros comerciais como a China e o Brasil

Roberto de Lira

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Não há um consenso entre os analistas políticos se houve algum vencedor no debate entre os candidatos à presidência da Argentina na noite desde domingo (12), transmitido pela rede de TV estatal. O ministro da Economia, Sergio Massa, e o ultraliberal Javier Milei apresentaram propostas e atacaram as do oponente, na tentativa de conquistar os votos de uma parcela estimada entre 12% e 20% (segundo as pesquisas) de eleitores que ainda não se decidiram ou que pretendem votar em branco ou nulo no próximo dia 19.

O debate presidencial foi intenso desde os primeiros minutos, uma vez a primeira parte foi totalmente dedicada à economia, tema no qual as diferenças de visão entre os candidatos são mais pronunciadas.

Como Milei vinha se esquivando de confirmar algumas das ideias que o levaram a se destacar desde as eleições prévias (PASO), Massa aproveitou para perguntar diretamente a ele se há mesmo intenção de adotar medidas extremas, como a dolarização da economia e a extinção do Banco Central. Após se negar a responder com um simples “sim” ou “não”, Milei confirmou.

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“Diga-me ‘sim ou não’ se vão dolarizar a economia, se vão fechar o Banco Central , se a AFJP (sistema privado de capitalização das pensões) vai voltar, se vão eliminar os subsídios ”, disparou Massa no início do debate.

O jornal Ámbito Financiero destacou que Milei inicialmente rejeitou as regras do jogo que o candidato da coligação União pela Pátria impôs e devolveu a provocação pedindo explicações sobre os níveis de inflação de 300%, pobreza de 40% e miséria de 10%. Massa replicou dizendo que em países onde a dolarização foi aplicada, “como o Zimbabue ou a Micronésia, ela falhou”.

Milei o acusou de mentir sobre isso mas confirmou seu planos mais audaciosos na sequência. “Sim, vou acabar com o BCRA (o BC local), porque é a origem da inflação. Vinte anos depois que saímos da conversibilidade, eles nos roubaram US$ 280 bilhões. Na verdade, o governo de criminosos do qual você participa está nos roubando US$ 90 bilhões. E este ano você está tirando mais US$ 25 bilhões. Querem continuar estragando nossas vidas roubando de nós com a inflação?”, questionou.

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China e Brasil

Na parte do debate sobre a relação comercial com o mundo, Massa voltou a questionar fortemente Milei sobre declarações contra a China e o Brasil, dois dos principais parceiros comerciais do país. Milei negou que pretenda cortar relações com esses países, mas sustentou que o comércio exterior deve ser orientado pelo setor privado.

“O Estado não precisa se envolver em negociações entre particulares. Quando você quer se envolver é para conseguir alguma vantagem para os amigos”, disparou. “Como liberal e libertário, acredito profundamente no comércio internacional e na abertura. Os países mais abertos ao mundo têm renda per capita nove vezes maior do que aqueles que estão fechados”.

Para Milei, “o Estado acaba sendo um estorvo” e o melhor exemplo é o que está acontecendo no Mercosul, “que não tem saída e não avança em direção a qualquer lado”.

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O libertário ratificou o seu “alinhamento com os Estados Unidos, Israel e o mundo livre” e disse não estar disposto a propor relações com aqueles que não respeitam a democracia liberal e as liberdades individuais.

Mas Massa acusou o oponente de tentar “derreter” as economias regionais do interior do país, que baseiam as suas exportações nas vendas para a China, e também procurou semear dúvidas sobre o conhecimento de Milei sobre o funcionamento do Estado.

Crise econômica

Sobre as condições atuais da economia, Milei acusou a gestão de Massa de ter “explodido a renda” dos argentinos. “Antes de ter a miséria que temos com você, de 350 mil pesos, teríamos 1,800 milhão de pesos . Veja a miséria que você gerou”, disparou o candidato da coligação A Liberdade Avança.

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Massa afirmou que a saída da crise se dará “com o aumento das exportações, uma vez que as projeções apontam, para uma alta de US$ 40 bilhões nas vendas externas em 2024. Com isso, ele disse acreditar que que surgirão novos empregos e com melhores rendimentos.

Ele repetiu sua intenção de avançar num acordo de unidade nacional, que permita a redução do sistema fiscal e das retenções cambiais, além de um caminho de simplificação fiscal para que as pequenas e médias consigam pagar seus impostos.

Massa disse que a Argentina está caminhando para um superávit fiscal, um superávit comercial, um regime de competitividade e acumulação de reservas que vão permitir o pagamentos dos empréstimos ao FMI retirar definitivamente sua supervisão na Argentina.

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Mas Milei disse que a Argentina “está em declínio há 100 anos”. “Começou o século XX sendo o país mais rico do mundo. Hoje somos o número 130. Temos 45% de pobres, 10% de indigentes e uma inflação em alta, com alto risco de hiperinflação como resultado do modelo de castas baseado na premissa de que, onde há necessidade, nasce um direito.”

Segundo análise do portal InfoBae, com seu DNA político, Massa conseguiu se sair bem no debate, mas há dúvida se isso pode ser considerado uma vitória, ou ao amenos um caminho para conquistar indeciso.

“O que vimos em geral entre os eleitores é que há muita confusão e desorientação sobre o que fazer com o seu voto. Longe de acrescentar coordenadas e dar-lhes sinais para definirem a sua posição, o debate colocou-os numa posição ainda mais incômoda do que aqueles que estavam antes”, argumentou Augusto Rena, da PulsAr-UBA.

“O que vimos em geral entre os eleitores do Juntos pela Mudança e os eleitores indecisos é que houve muita confusão e desorientação sobre o que fazer com o seu voto. Longe de acrescentar coordenadas e dar-lhes sinais para definirem a sua posição, o debate colocou-os numa posição ainda mais incómoda do que aqueles que estavam antes”, explicou o investigador.