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A divisão dos bens de uma pessoa que faleceu é muitas vezes um momento de tensão em muitas famílias, em especial quando existe um patrimônio valioso a ser dividido entre os herdeiros.
Se isso já é uma dor de cabeça quando o espólio envolve só imóveis e investimentos, o problema fica ainda mais delicado quando o que está em jogo são os ativos digitais.
Nessa lista estão desde criptoativos, contas em redes sociais e até senhas de e-mail. Como a discussão ainda é muito nova, o Judiciário brasileiro ainda está longe de um consenso sobre o tema.
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O assunto, que está movimentando escritórios de advocacia pelo país, ganhou força em meio à discussão relativa ao espólio da cantora Marília Mendonça, que morreu há um ano em um acidente aéreo.
Em seu inventário estaria, por exemplo, um perfil do Instagram com mais de 40 milhões de seguidores, além de sua conta no YouTube, com centenas de milhões de visualizações, além dos direitos autorais de todas as músicas da cantora. A ação relativa a Marília corre sob sigilo de Justiça.
Sócia da SFCB advogados, Veridiana Fraga confirma o crescimento de questionamentos de clientes. Segundo ela, o caso de Marília Mendonça está sendo acompanhado com atenção. “Temos recebido consultas há cerca de um ano sobre herança digital, se ela faz parte do direito de sucessão ou não”, comenta a especialista.
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Privacidade
Um dos pontos que vêm sendo analisados pela Justiça é a questão de privacidade da pessoa falecida – já que e-mail ou celular podem conter informações privadas de anos da vida da pessoa em questão.
No entanto, a coisa muda de figura quando o histórico dessa pessoa em plataformas digitais tem um valor monetário claro, como é o caso da cantora sertaneja.
Segundo Fraga, as pessoas devem ficar atentas aos termos de uso das plataformas, já que as empresas possuem a opção de extinguir a conta em caso de morte.
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“Isso ajudará o trabalho do Judiciário, que ainda não está maduro nessa questão”, explica.
A especialista afirma que definir um valor para uma conta em rede social é difícil. Uma das alternativas seria a venda de contas para empresas que compram contas com milhares de seguidores – isto, é claro, se o herdeiro ganhar o direito sobre esse ativo.
Para Nathalie Fragoso, sócia do escritório VMCA, é preciso que as famílias estejam atentas ao que diz o texto da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) brasileira.
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“A lei de proteção aos dados se refere aos dados de pessoas naturais, conceito que abriga os vivos e se encerra com a morte”, explica.
Especialistas lembram que a vida digital de uma pessoa pode não apenas conter informações sensíveis sobre a pessoa falecida, mas também de terceiros próximos a ela.
Conceito
Segundo a advogada Ana Frazão, sócia da Ana Frazão Advogados e professora da faculdade de Direito da Universidade de Brasília, é necessário separar conteúdo de patrimônio. Tudo o que se encaixar no primeiro caso, segundo ela, não deveria virar herança.
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“Tudo que envolve dados pessoais e sensíveis não deveria, em princípio, ser suscetível à sucessão”, explica.
No caso de algo que é notoriamente comercial, como acontece com as celebridades, o entendimento que deve prevalecer, na sua opinião, é de que se trata de mais um bem passível de inclusão no inventário.
No caso de uma rede social de alguém famoso, como a de Marília Mendonça, a especialista considera a possibilidade de a conta passar aos herdeiros, até porque ela poderá ser utilizada para memória da artista entre seus fãs. Na falta de consenso, porém, o Judiciário tem analisado os processos caso a caso.
Para ativos cujo valor econômico é notório e reconhecido, tal como criptomoedas ou uma NFT, é natural que eles estejam dentro da gama de bens da sucessão.
Frazão diz que, no caso de contas de redes sociais, a conta não é tão fácil. Por isso, uma das saídas possa ser a elaboração de um inventário digital prévio, em caso de pessoas que monetizem seus dados em redes sociais, por exemplo.
Milhas aéreas?
Mesmo que o tema avance, ainda há muitas incertezas – e muitas vezes as decisões da Justiça não são a favor dos “candidatos” a herdeiros.
Uma decisão recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por exemplo, entendeu que as milhas de programas de fidelidade não podem ser consideradas dentro do acervo hereditário – pois são consideradas um item “personalíssimo”.
A leitura do STJ foi de que as milhas são um benefício e, por isso, não possuem uma natureza patrimonial. Para Ana Frazão, a decisão reforça a falta de consenso sobre o caso. Para ela, porém, esse entendimento tem espaço para ser questionado.