UTIL, índice de utilidades públicas, e IEE, de elétricas, saltam mais de 100% em 5 anos: o que aconteceu e o que monitorar?

Melhora de aparato regulatório, de segurança jurídica e sinalizações de privatizações puxam as altas dos dois setores

Vitor Azevedo

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Os índices da B3 de utilidade pública (UTIL), que inclui os setores de energia elétrica, água, saneamento e gás, e mais especificamente o de energia elétrica (IEE) da B3 acumulam nos últimos cinco anos fortes altas, de 162,9% e 136,2%, respectivamente, à frente de outros benchmarks setoriais como os de varejo, materiais básicos e dividendos.

Dentro dos índices, nomes como Cemig (CMIG4), Copel (CPLE6) e Eletrobras (ELET6) são destaques, com altas de 485%, 481% e 318,4%. Do lado de saneamento, a Sabesp (SBSP3) disparou 172%.

As informações, providas pelo TradeMap, levando em consideração os cinco anos antecedentes ao dia 30 de junho, pode até causar curiosidade: empresas do ramo de energia elétrica e de saneamento não costumam ter crescimentos exponenciais nos seus lucros, o avanço operacional é custoso, dependendo de investimentos pesados, e o repasse de preços depende da aprovação de agências reguladoras. Mas há motivos fortes que embasam os avanços.

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Fonte: TradeMap

De acordo com dados da mesma casa, o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização, na sigla em inglês) do IEE, saiu de R$ 58,8 bilhões em 2018 para R$ 85,9 bilhões em 2022, alta de 49,4% – isso desconsiderando a Auren (AURE3), que compõe hoje o benchmark mas que não tem dados de todos os anos. No UTIL, desconsiderando a mesma Auren e também a Ambipar (AMBP3), o crescimento foi menor, de aproximadamente 41%.

No primeiro momento, de acordo com Felipe Pontes, sócio da L4 Capital, a alta desses índices foi motivada por uma recuperação dada após anos conturbados.

“Vale lembrar de quão ruim o Governo Dilma [Rousseff] foi para as empresas do setor, com anúncios como de, por exemplo: renovação antecipada das concessões de energia que venceriam entre 2015 e 2017, mas com redução das tarifas; indenizações insuficientes pelos investimentos feitos em infraestrutura; e muita incerteza regulatória”, diz.

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Em 2015, por exemplo, após a crise por conta da Medida Provisória 579 anunciada em 2012, foi criado o sistema de bandeiras tarifárias, que dá mais segurança para as distribuidoras, permitindo-lhes repassarem os gastos que têm com a aquisição de energia em períodos de seca, por exemplo. A MP em questão renovou as concessões de energia elétricas e impôs a redução das tarifas.

“A consolidação de governos mais pró-mercado ajudou a reduzir o risco regulatório, que também ajuda a reduzir o custo do capital e aumentar o valor das ações”, fala o especialista. “Em 2018 e 2019, em especial, tivemos ótimos anos para empresas do setor de energia elétrica porque estávamos em processo de consolidação de movimentos importantes na nossa economia, depois de anos conturbados com o Governo Dilma, em especial para empresas desse setor.  O consumo interno parecia ser a bola da vez e depois vieram movimentos relacionados à infraestrutura que favorecem empresas do setor”.

Leis mais rígidas nos dois setores foram, em parte, também responsáveis por outra característica que agrada a alguns investidores nessas empresas: os dividendos. Com taxas melhores delimitadas, e menor chance de intervenção, as companhias de energia e saneamento pagam proventos de forma boa e constante, uma vez que mesmo em crises as pessoas continuam com gastos nas duas frentes.

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“Nos últimos anos observamos um crescimento relevante dos investidores pessoa física na Bolsa, com uma parte significativa desse fluxo indo naturalmente indo para as empresas que conseguem pagar bons dividendos recorrentemente”, explica Bernardo Viero, analista da Suno Research. “É difícil cravar apenas um motivo para essa alta”.

De acordo com o especialista, a natureza do modelo de negócio das empresas traz previsibilidade sobre os resultados no longo prazo, por exemplo, o que joga a favor das companhias. “Isso, sobretudo, em um país em que as recorrentes oscilações econômicas prejudicam a maioria dos negócios sem o mesmo nível de recorrência na demanda, facilidade no repasse da inflação e, consequentemente, acesso a capital a custos menos elevados que a média”, menciona.

Ele destaca também que o setor elétrico é diferenciado ao ter diversas empresas de qualidade. “Elas aproveitaram as diversas oportunidades em geração renovável, linhas de transmissão e de expansão de bases de ativos em distribuição, executando muito bem os investimentos que se converteram em mais resultados, que no final das contas, é o que move as cotações no longo prazo”, debate.

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Maíra Maldonado, analista da XP, realça o perfil resiliente das empresas e os avanços nos arcabouços regulatórios dos dois setores, com destaque para o Marco do Saneamento no segundo, o que contribuiu também para as ações de empresas de utilidades públicas, ou utilities, além de elétricas (no caso, saneamento).

O Marco Legal do Saneamento Básico no Brasil, ou Lei nº 14.026/20, foi aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado em julho de 2020. Esta lei estabelece um novo marco regulatório para o setor de saneamento básico no Brasil, com o objetivo de universalizar e qualificar a prestação dos serviços no setor, e estipula uma maior participação da iniciativa privada no setor.

No setor elétrico, ela destaca a performance das transmissoras, com os bons resultados dos business sendo o grande diferencial. Potenciais privatizações, caso da Copel (CPLE6), no cenário mais próximo, e da Cemig (CMIG4), também puxam os índices.

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“Acho que vale continuar acompanhando as notícias sobre as potenciais privatização e também a questão da renovação das concessões das distribuidoras. Creio que serão os principais triggers”, fala a analista. “A privatização da Eletrobras (ELET3), por exemplo, tornou a companhia, e em parte o setor elétrico, mais eficiente”.

Guilherme Paulo, operador de renda variável da Manchester Investimentos, também destaca que, em saneamento, as privatizações da Sabesp (SBSP3) estão avançando, enquanto para Copasa (CSMG3) seguem no radar.

“Depois da aprovação do marco, a gente já teve leilões de concessões em diversos lugares, com o destaque ficando para o Rio de Janeiro, que foi o maior recentemente.  A gente tem diversas empresas listadas e não listadas que estão aproveitando essas oportunidades, com várias movimentações no âmbito da privatização e também em IPOs”, debate.

De acordo com ele, com o marco, mesmo companhias estatais estão buscando eficiência para se tornarem mais competitivas no setor.

“Nesse último ano, houve a tentativa de alterar alguns pontos importantes, especialmente privilegiando estatais ineficientes dentro do marco do saneamento. Mas isso foi revogado, a Câmara não permitiu, o Congresso não permitiu. Foi dado um sinal mais claro para o setor, de que investidores podem aportar sem receio. Criou-se certa previsibilidade na questão das concessões públicas”, fala Guilherme Paulo.

A privatização da Eletrobras, e o impedimento da sua revisão, de acordo com ele, vão no mesmo caminho.

“O principal argumento na venda da estatal foi também a questão da capacidade de investimentos. A empresa não tinha mais tantos novos projetos, não inovava mais, sem tanto espaço no balanço para isso, e precisava de novos sócios. Então, devido à importância do setor energético, a privatização foi o caminho escolhido para buscar as melhorias que o setor privado consegue trazer”, comenta.

A Eletrobras, ele lembra, é detentora de praticamente metade das redes de transição do Brasil e de parte relevante da geração de energia. Se gerida de melhor maneira, trará benefícios importantes para o setor de energética brasileira.

“A gente vai ter provavelmente novos projetos de geração e de transmissão com uma melhor alocação de capital. Uma energia mais barata lá no final, o que é melhor para todos. Inclusive os leilões que vão ser feitos de transmissão agora vão suprir essa demanda”, comentou, em menção aos leilões realizados nesta sexta e os que ainda ocorrerão até 2024.

Para além das questões políticas, por fim, especialistas falam também sobre os juros, que tiveram forte impacto na performance dos índices neste ano e que também devem ser monitorados.

“Quando se olha para os setores, especialmente o de transmissão, existe uma correlação grande com os juros. Eles são mais intensivos em capital. À medida que o debate sobre a queda da taxa de juros se intensificou, isso resultou nessa boa subida. Então eu acho que isso é parte da história, o fato de parte do setor ser intensiva em capital”, fala Arbetman.

Por outro lado, as companhias também se beneficiam pela questão da alavancagem. Como precisam de uma grande quantidade de capital para novos projetos, empresas dos dois setores tendem a ser um tanto endividadas. O recuo das taxas, então, tira pressão também dessa frente.

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