O que está em jogo para a Petrobras (PETR4) e suas ações ao “segurar” preços dos combustíveis?

Analistas ainda não veem empresa queimando caixa, mas apontam que movimento pode causar ruído para ações e destacam outro setor beneficiado

Lara Rizério

(Foto: Getty Images)
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Na última terça-feira (1), mais uma notícia causou ruído para as ações da Petrobras (PETR3;PETR4).

As especulações aumentaram sobre um eventual anúncio de alta dos preços dos combustíveis, dada a diferença das cotações praticadas pela Petrobras em relação ao exterior e refinarias nacionais – após a alta do preço do petróleo em julho em cerca de 13% (apesar das últimas duas sessões terem sido de queda para a commodity).

Jean Paul Prates, CEO da estatal, se pronunciou, movimentando o mercado. Ele disse que não procederiam rumores de que iria aumentar entre ontem e hoje os preços dos combustíveis e que esse não foi tema de reunião com nomes do governo.

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“Em nenhum momento falamos de preço, pode ser que lá na frente eu tenha que chegar e dizer que vou aumentar, mas não vou aumentar agora, estamos confortáveis com essa volatilidade”, disse o ex-senador, ressaltando que o petróleo estava em queda na sessão. “Se o preço se estabelecer em outro patamar, vamos ponderar e fazer o reajuste necessário”, garantiu.

As ações chegaram a ter forte baixa (de cerca de 4%) na véspera após a notícia, uma vez que o não reajuste pode diminuir as projeções de rentabilidade da estatal, mas fecharam longe das mínimas. 

“Os comentários de Prates foram em linha com o comunicado de imprensa da estatal na noite de segunda-feira, que disse que a empresa não iria repassar a volatilidade de curto prazo para os preços domésticos”, avalia o Bradesco BBI.

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Com esse cenário no radar, os analistas de mercado apontam os possíveis impactos de segurar preços para a tese de investimentos na companhia e para as suas ações.

O Citi aponta que, desde maio de 2023, quando a Petrobras anunciou sua nova política de preços de combustíveis, a empresa reduziu o preço do diesel na refinaria em 21,3%, de R$ 3,84 o litro para R$ 3,02 o litro, e da gasolina em 16,4%, de R$ 3,18 o litro a R$ 2,66o litro.

O Brasil precisa importar cerca de 20% da demanda de diesel e gasolina e, após a recente recuperação do petróleo, os preços nas refinarias domésticas estão cerca de 20% abaixo da paridade internacional nos principais portos do Brasil, o que potencialmente coloca os importadores fora do mercado.

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Isso significa que a estatal precisaria aumentar os preços ou aumentar suas próprias importações para garantir o abastecimento (as importações de gasolina + diesel no segundo trimestre de 2023 aumentaram 33% frente o 1T23), levantando questões sobre se há capacidade da estatal de comprar internacionalmente a um preço mais baixo do que vendem no Brasil, ou então até mesmo incorrer em uma perda.

“É importante observar que, desde abril, uma quantidade relevante de diesel russo começou a ser importada por agentes brasileiros, tomando parte do diesel americano e representando cerca de 64% das importações de diesel do Brasil em junho de 2023”, apontam os analistas do Citi.

No entanto, de acordo com os importadores, o desconto do diesel russo em relação às refinarias da Petrobras, que chegou a R$ 0,50 por litro em abril/maio de 2023, agora é zero e ocasionalmente apresenta um prêmio em relação ao diesel da Petrobras no momento.

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Para diminuir a dependência externa e reduzir as chances de um cenário de escassez, a Petrobras está operando com alto nível de utilização em suas refinarias, chegando a 95% em maio de 2023.

Mas, aponta o Citi, mesmo com esse esforço, a empresa não consegue abastecer totalmente o mercado brasileiro.

“Acreditamos que existem dois caminhos para o mercado brasileiro evitar um possível desabastecimento: 1) a estatal aumentaria os preços na refinaria para viabilizar a atividade de importação de combustíveis; 2) a Petrobras importa todo o volume necessário de diesel e gasolina”, destacam os analistas.

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Com base nisso, os analistas desenvolveram uma simulação em que a Petrobras importaria 100% da necessidade de volumes de diesel e gasolina para atender a demanda brasileira enquanto venderia os combustíveis a preços locais.

Visando entender melhor qual pode ser o impacto no lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (Ebitda, na sigla em inglês) da Petrobras, o Citi fez uma simulação, estimando um custo de importação de US$ 5 por barril (bbl), dólar a R$ 4,79 e  barril do brent a US$ 85/ bbl, os analistas veem um impacto de cerca de US$ 37 milhões por dia (anualizado em US$ 13,2 bilhões por ano) no segmento de downstream (refino), neste cenário de escassez.

“A nosso ver, acreditamos que a Petrobras ainda não está queimando caixa com atividades de refino, mas a empresa está operando com uma margem de crack spread (diferencial entre o preço do petróleo e os produtos derivados do petróleo dele extraídos) muito abaixo do nível internacional”, aponta o banco.

Já em suas verificações de canal, os analistas do Goldman Sachs apontam que navios com diesel devem chegar ao Brasil em agosto, o que poderia evitar uma potencial escassez de combustíveis (mas isso deve ser pelo menos parcialmente contrabalançado por alguns players que buscam exportar diesel devido ao atual alto nível de desconto visto no produto da Petrobras).

Para os analistas do Goldman, os aumentos no preço dos combustíveis podem trazer mais ruído em torno da Petrobras. Como visto em vários momentos no passado, os reajustes represados de preços de combustível num cenário de aumento dos preços do Brent no exterior levaram a um ruído elevado em torno das ações da Petrobras.

Além disso, o novo governo (acionista majoritário da estatal) tem falado sobre a mudança da política de preços de combustíveis no Brasil (anunciada em maio) com o objetivo de diminuir os preços na bomba.

“Em suma, acreditamos que uma alta nos preços dos combustíveis pode trazer de volta alguns dos
ruídos observados em anos anteriores. Além disso, notamos que os preços dos combustíveis são um meio para lidar com as expectativas de inflação”, aponta o Goldman.

Os preços mais altos podem elevar as expectativas de inflação, potencialmente atrasando ou diminuindo a intensidade um ciclo de corte de juros no Brasil (que é outro tema sobre o qual o governo tem falado).

Porém, o Goldman aponta que, em última análise, os preços mais altos do petróleo brent são positivos para a empresa. O Ebitda do segmento upstream (exploração e produção de petróleo) se beneficia de maiores preços do petróleo em maior medida do que o Ebitda do refino é impactado pelos preços congelados de diesel e gasolina.

“Para contextualizar, cada aumento de US$ 10/bbl no Brent sem um aumento nos preços do diesel e da gasolina implicaria em Ebitda e fluxo de caixa livre ainda impactados positivamente em cerca de US$ 2,2 bilhão e US$ 1,6 bilhão, respectivamente (sem levar em conta o ônus de assumir importações de players privados)” destaca.

“Hipoteticamente, se fôssemos assumir que a Petrobras importaria todos os volumes de diesel e gasolina atualmente importados pelos players privados, isso implica que o Ebitda e o fluxo de caixa livre ainda totalizariam US$ 1,5 bilhão e US$ 1,1 bilhão, respectivamente”, complementa o banco.

Na mesma linha, o BTG Pactual aponta que, enquanto os descontos de paridade de importação (IPP) permanecerem baixos, os bons resultados do segmento de exploração e produção ainda preservariam a sólida geração de caixa. Com base nos preços do Brent de US$ 80/barril, estima uma queda de 8% e 13% no Ebitda anual da empresa e na distribuição de dividendos, respectivamente, para cada 10% de desconto no preço da gasolina e do diesel.

Dito isso, não considera que a Petrobras será responsável pela importação de combustíveis no Brasil. Assumindo que a empresa internalize todas as importações de combustível do Brasil, o impacto combinado seria obviamente maior.

“Os descontos estão atualmente em 28% em média, com base em nossos cálculos, mas achamos que os grandes volumes de diesel russo importados nos últimos meses (55% das importações no segundo trimestre) estão ajudando a aliviar as pressões por reajustes de preços”, avalia o BTG.

Isso não deve ser estrutural, no entanto, e acredita que a capacidade da Petrobras de fazer ajustes no curto prazo será de extrema importância para que mais dividendos não sejam sacrificados.

Tanto Citi quanto Goldman Sachs possuem recomendação equivalente à compra para as ações da companhia, com o primeiro tendo preço-alvo de US$ 19 para os ADRs (recibo de ações negociado nos EUA) para os ativos PBR da companhia (equivalente aos ordinários), enquanto o Goldman tem preço-alvo de R$ 41,90 para as ações PN PETR4 (upside de 35%).

Enquanto isso, o BTG Pactual destacou  seguir com recomendação neutra para as ações da Petrobras, com preço-alvo de R$ 34 para PETR4, principalmente por conta do valuation após a recente alta, de 48% no acumulado do ano.

Os analistas do BTG destacaram terem ficado mais otimistas em relação à tese; no entanto, também avaliam que uma postura estruturalmente mais otimista dependerá (i) de uma convicção mais forte de que a empresa evitará fusões e aquisições significativas além do negócio principal, (ii) de que os descontos nos preços dos combustíveis não colocarão em risco a lucratividade ou aumentarão a participação da Petrobras nas importações de combustíveis, e (iii) que a empresa pode pagar dividendos extraordinários até o final de 2023 para evitar acumular muito caixa.

Distribuidoras são beneficiadas?

Os analistas do Citi ainda apontam que, no cenário atual de não haver mais desconto do diesel russo, as principais distribuidoras de combustíveis – como Raízen (RAIZ4), Vibra (VBBR3) e Ultrapar (UGPA3) – devem se beneficiar.

Isso por dois motivos: 1) estabilidade de preços, considerando que aparentemente o setor de distribuição de combustíveis se beneficia em cenários de baixa volatilidade de preços; 2) os players independentes devem perder competitividade nesse cenário, visto que alguns pequenos distribuidores abriram mão de cotas de compra nas refinarias da Petrobras para aproveitar o maior desconto do preço do diesel russo.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.