Nos últimos anos, o Bitcoin (BTC) deixou de ser assunto de nerd e virou pop, ganhando espaço inclusive no portfólio de investidores institucionais. Com isso, as palavras tokens e criptomoedas não saíram mais do disputado noticiário econômico. No entanto, essas novas tecnologias ainda geram certa confusão.

Neste guia, o InfoMoney detalha o que é um token, revela quais os principais tipos existentes no mercado e explica como eles são criados. Aborda, também, quais são as diferenças entre tokens e criptomoedas.

O que é token?

Token, em inglês, significa ficha ou símbolo. Na área da tecnologia, o nome se refere a um dispositivo eletrônico/sistema gerador de senhas bastante utilizado por bancos.

No universo das criptomoedas, no entanto, a palavra ganha outra definição. Em resumo, significa a representação digital de um ativo – dinheiro, propriedade e investimento, por exemplo – em uma blockchain. Blockchain é o nome da tecnologia de registro distribuído (DLT, na sigla em inglês) que nasceu junto com o Bitcoin (BTC) no final de 2008. Em síntese, ela é um grande livro-razão que registra as transações entre pessoas (peer-to-peer, P2P), sem um intermediário.

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As moedas que nascem com blockchains, como o BTC e o Ethereum (ETH), também podem ser consideradas tokens, segundo fontes ouvidas pela InfoMoney, bem como a Coinbase, umas das principais exchanges do mundo.

Tipos de token

A todo o momento, o mercado cria novos tipos de tokens, com propostas, sabores e nomes variados. No geral, no entanto, é possível dividi-los em quatro categorias principais.

Payment Tokens

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Os Payment tokens são utilizados para transferência de capital, funcionando como dinheiro eletrônico. O Bitcoin, o Ethereum e boa parte das mais de 10 mil criptomoedas existentes no mercado se enquadram nessa categoria.

Utility tokens

Os Utility tokens oferecem alguma utilidade, como desconto em um produto específico ou acesso a um serviço exclusivo. Os fan tokens, ativos digitais de clubes de futebol, são exemplos. Alguns times dão aos detentores o direito de votar em enquetes, escolher a frase a ser escrita em alguma dependência do estádio, participar de promoções ou ter acessos exclusivos a locais.

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Non-fungible tokens (NFT)

Non-fungible tokens (NFT) ou tokens não-fungíveis – são tokens que representam algo único. Eles podem “espelhar” obras de arte, músicas, capas históricas de revistas e até tweets. Ao adquirir um NFT, a pessoa basicamente compra um código de computador que contém o registro do objeto.

Security tokens

Os Security tokens representam algum valor imobiliário, como uma ação negociada na Bolsa de Valores. Como estão “ligados” a produtos regulados, eles precisam atender às regras de supervisores do mercado de capitais.

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Cabe lembrar que, a depender do projeto, um token pode ser considerado um valor mobiliário. Nesse caso, precisa passar pelo crivo dos reguladores.

Para identificar se algum ativo digital se enquadra nessa categoria, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), assim como a SEC (Securities and Exchange Commission, equivalente americano da CVM) nos Estados Unidos, realizam um teste chamado Howey Test.

Nessa avaliação, as duas agências reguladoras submetem o ativo a cinco parâmetros para determinar se sua oferta estará sob jurisdição do órgão. Se sim, é considerado um valor mobiliário e,

portanto, passa a ser considerado um security token.

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Diferença entre token e criptomoedas

Toda criptomoeda é um token, mas nem todo token é uma criptomoeda, segundo Rafael Nasser, professor doutor em Informática da PUC-Rio. De acordo com ele, o BTC seria o token da rede Bitcoin, enquanto o ETH seria o token da blockchain do Ethereum.

Em texto publicado em seu site, a Coinbase, uma das maiores exchanges do mundo, também afirma que tecnicamente o Bitcoin e Ethereum se enquadram nessa categoria. Os dois criptoativos, portanto, seriam payment tokens, visto que são utilizados para transferência de capital, e funcionam como dinheiro eletrônico.

A definição de token e criptomoedas, no entanto, não é unânime. A própria Coinbase, no mesmo material, diz que a palavra token passou a ser usada pelo mercado apenas para se referir a ativos digitais além de Bitcoin e Ethereum, “executados sobre a blockchain de outras criptomoedas”.

Portanto, segundo essa convenção, BTC e ETH seriam chamadas de criptomoedas nativas, e tokens seriam apenas aquelas moedas criadas em blockchains já existentes, como a rede do Ethereum, a Binance Smart Chain (BSC) e a Cardano (ADA), por exemplo. Dois exemplos de tokens desenvolvidos em sistemas externos são o Shiba Inu (SHIB) e o Axie Infinity (AXS).

Quanto vale um token?

O valor de um token é baseado em seu lastro. Veja alguns exemplos:

No caso das stablecoins, que são tokens pareados em moeda fiduciária, uma unidade equivale a uma unidade de seu par, seja dólar, real, euro etc.

O USD Coin (USDC), da Centre – consórcio fundado por Circle e Coinbase –, é pareado no dólar. Um USDC, portanto, vale US$ 1. Para cada ativo que a empresa emite, ela tem o mesmo valor em moeda fiduciária. Outro exemplo é o Tether (USDT), cuja unidade também vale US$ 1. Cabe lembrar, no entanto, que o grupo por trás do USDT foi acusado pela Comissão para Negociação de Futuros de Commodities dos Estados Unidos (CFTC, na sigla em inglês) de mentir sobre as reservas de dólar.

Já se o token é lastreado em ativos como contratos de aluguel, basta fazer um cálculo matemático simples para chegar ao seu valor. Se um contrato vale R$ 5 milhões e foi desmembrado em 5 milhões de unidades forem emitidos, então cada um vale R$ 1. Se em vez de 5 milhões, apenas 10 tokens forem lançados para esse mesmo contrato de locação, então cada um teria o preço de R$ 500 mil.

O valor de um token também varia conforme o mercado. Na prática, funciona como uma ação negociada em bolsa de valores. Se uma pessoa compra a criptomoeda Cardano (ADA), por exemplo, e a rede do projeto (que pode ser entendida como seu lastro) cresce,

atraindo mais interesse e mais investimento, o valor da moeda também sobe.

No caso do Bitcoin, o lastro é a própria blockchain da criptomoeda, que tem um alto poder computacional, e nunca foi hackeada. Em relação ao Ethereum, é sua tecnologia de construção de contratos inteligentes. Os smart contracts, na tradução para o inglês, são códigos de programação que se executam conforme regras pré-estabelecidas, sem o envolvimento de um intermediário fazendo o controle.

Como funciona?

O funcionamento do token depende do projeto e da categoria na qual o ativo se enquadra. No geral, no entanto, eles “rodam” em alguma blockchain. Além disso, são baseados em contratos inteligentes.

Os payments tokens funcionam como meio de pagamento. Os utility tokens, por outro lado, dão acesso a serviços exclusivos, cupons de descontos, direito a voto e outros benefícios.

Já os NFTs (sigla em inglês para tokens não-fungíveis) representam algo único – portanto, são itens virtuais colecionáveis exclusivos. O security token, por fim, é semelhante a valores mobiliários, como ações, e dão direito a lucro. 

Como é criado?

A criação depende do tipo de ativo, bem como da própria organização por trás do projeto. Daniel Coquieri, CEO da Liqi Digital Assets, resumiu para o InfoMoney como um contrato de locação é transformado em um token por sua equipe:

“Uma empresa dona de um prédio aluga a fachada do empreendimento para uma concessionária por 10 anos. Esse contrato formalizado pelas duas partes é um ativo. Como também é um recebível, a empresa, que precisa de fluxo de caixa, normalmente vai até o banco para tentar antecipá-lo. A instituição bancária pede garantia, coloca juros etc”.

“O que é possível fazer é pegar esse contrato de aluguel e ceder esses recebíveis para tokens da blockchain. Na prática, ao fazer isso, o direito de receber o aluguel, que antes era da empresa, passa para os tokens. Todas as regras são acertadas em contrato”.

Depois do acordo entre as partes, falou Coquieri, emitem-se os tokens na blockchain, de forma fracionada. Todas as operações financeiras, com juros e amortizações, bem como as regras, são programadas em smart contracts. Por fim, inicia-se a venda e a distribuição dos ativos. 

“A venda é um processo parecido com o que ocorre em corretoras de criptomoedas. A pessoa se cadastra na plataforma que está vendendo o ativo e realiza a compra, assim como faz quando adquire Bitcoin ou Ethereum. A diferença é que, na tokenização, a gente começa com oferta primária, e depois abre a secundária. O mecanismo é bem parecido com uma oferta pública inicial (IPO)”, disse. 

A IPO no universo das criptomoedas recebe o nome de ICO, sigla de Initial Coin Offering. Em português, a expressão pode ser traduzida como oferta inicial de moedas digitais ou oferta inicial de ativos virtuais. Na prática, o mecanismo consiste em ofertar ao mercado novos criptoativos ou projetos baseados em blockchain.

É possível criar tokens em diversas blockchains. A primeira, maior e mais utilizada é a rede do Ethereum. A maioria dos tokens criados nela segue o padrão ERC-20, que é um conjunto de regras de programação que precisam ser seguidas pelos desenvolvedores. Apesar de líder no mercado, a blockchain criada por Vitalik Buterin ainda sofre com excesso de transações, lentidão e altas taxas.

Tokens também podem ser desenvolvidos em redes como a Binance Smart Chain (BSC), da corretora Binance, maior do mundo em volume de negociação. É uma rede mais barata que a Ethereum, porém mais centralizada. Outras blockchains conhecidas são Cardano, Solana, Tezos e a brasileira Hathor. 

O que pode virar token?

Quase tudo. É possível transformar em tokens ativos tangíveis, como dinheiro, imóveis e equipamentos, e intangíveis, a exemplo de empréstimos e direitos autorais. Há casos de pessoas que se transformaram em tokens e venderam parte de sua força de trabalho a terceiros.

Quando algo é “tokenizado”, basicamente é fragmentado em frações digitais. Uma propriedade avaliada em R$ 10 milhões pode ser dividida em 10 mil tokens, cada um valendo R$ 1.000, por exemplo.

“Fazendo um paralelo com o mercado financeiro, esse processo é basicamente uma securitização, com a diferença de ser feito em uma blockchain, por meio de contratos inteligentes”, disse Jefferson Prestes, profissional de TI e professor da PUC-SP.

O que é fan token?

Os fan tokens são utility tokens (tokens de utilidade). Os detentores têm acesso a bens e serviços ofertados pelo projeto. No caso de ativos de futebol, por exemplo, os clubes oferecem participação em lives, votação em enquetes para escolher músicas e até a possibilidade de votar em frases escritas no vestiário.

Diferente dos payment tokens, os fan tokens têm apenas utilidade dentro de um ecossistema onde são aceitos. Portanto, eles não funcionam como moeda ou como valor mobiliário, e não é possível usá-los como pagamento.

No Brasil, times como Flamengo, Cruzeiro, Santos e Corinthians têm fan tokens. Até a seleção brasileira resolveu apostar nesse mercado, lançando o Brazilian Fan Tokens (BFT) em julho de 2021. A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) arrecadou R$ 90 milhões com a oferta inicial de 30 milhões de ativos – isso em apenas 20 minutos.

Leia também: Fan tokens e NFTs invadem futebol com promessa de torcedor feliz e dinheiro no bolso

Tokens são seguros?

Coquieri disse que a blockchain, tecnologia na qual os tokens são criados, é segura. Essa afirmação, segundo ele, é validada por redes com a do Bitcoin e do Ethereum, que até hoje estão em pé, guardando milhões de dólares.

“No entanto, já tivemos casos de tokens DeFi (sigla em inglês para finanças descentralizadas) com smart contracts mal programados, com falhas que deram a hackers a chance de roubar os ativos dos usuários”.

Para não perder dinheiro em tokens falhos, ainda de acordo com o Coquieri, o ideal é que os investidores avaliem com cuidado os fundamentos de cada projeto. “Você não sai comprando uma ação na bolsa sem saber o histórico da empresa. Com os tokens funciona da mesma forma”, disse.

Quais são os 10 maiores tokens em valor de mercado?

De acordo com o CoinMarketCap, os tokens de criptomoedas com maior capitalização no início de novembro de 2021 são os seguintes:

Token*Capitalização
Tether (USDT)R$ 402,5 bilhões
USD Coin (USDC)R$ 189,4 bilhões
Shiba Inu (SHIB)R$ 159 bilhões
Uniswap (UNI)R$ 89,3 bilhões
Binance USD (BUSD)R$ 79,8 bilhões
Wrapped Bitcoin (WBTC)R$ 79,1 bilhões
Chainlink (LINK)R$ 78,8 bilhões
Axie Infinity (AXS)R$ 50,2 bilhões
FTX Token (FTT)R$ 29,4 bilhões
Crypto.com Coin (CRO)R$ 28,7 bilhões

*A lista cita apenas tokens criados em blockchains terceiras; criptomoedas como Bitcoin e Ethereum, que são nativas, não são consideradas.