As 6 lições que aprendi com o filme “A Grande Aposta”, segundo o trader Leandro Ruschel

Para começar, seja cauteloso e não coloque todos os ovos em uma cesta só, diz Leandro Ruschel, fundador da escola de traders Leandro & Stormer e da Liberta Global

Paula Barra

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SÃO PAULO – Essencial para os apaixonados pelo mercado financeiro, o filme “A Grande Aposta” traz mais do que uma aula sobre o crash de 2008 nos Estados Unidos, iniciado através do estouro da bolha imobiliária. Ele deixa importantes lições para aqueles que estão em busca do próximo “grande trade” na Bolsa, diz Leandro Ruschel, fundador da escola de traders Leandro & Stormer e da Liberta Global. 

As lições estão pautadas principalmente em torno de sentimentos que acompanham os investidores mais antigos e bilionários da Bolsa: seja cauteloso e não coloque todos os ovos em uma cesta só.

No filme, um grupo de investidores percebe a insustentabilidade dos bonds de crédito imobiliário e começa a montar uma posição no mercado para lucrar com a inevitável queda – por isso, o título em inglês “The Big Short”, dado que, no mercado financeiro, o termo “short” é lido como venda, especialmente a descoberto. Graças à visão do gestor de hedge fund esquisitão, interpretado por Michael Burry, que identifica essa reversão no mercado, esse grupo de investidores consegue ganhar muito dinheiro com o estouro da crise, enquanto os bancos acreditavam que iam lucrar cada vez mais com os bonds de crédito. 

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Em meio ao rico roteiro do filme, Ruschel, que opera há 15 anos no mercado, aponta 6 lições que todo investidor deveria seguir antes de iniciar sua “grande aposta”. Antes de partir para as lições, quem não viu o filme ainda precisa correr para o cinema o quanto antes. Lançado em 14 de janeiro, o filme deve ficar em cartaz só até semana que vem nos cinemas brasileiros. 

Confira abaixo as 6 lições extraídas do filme:

1)  Acreditar em uma única aposta que te deixe rico

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Claro que enriquecer em um único trade é o sonho de muitos, mas, como dizem, o cemitério de Wall Street é muito silencioso. No filme, o personagem principal desperta a cobiça de qualquer um. Mas para cada sujeito que arrisca tudo e vai para casa com um cheque de US$ 100 milhões, talvez tenhamos mil sujeitos que perdem tudo, e ninguém faz filme sobre esses sujeitos.

“É muito mais fácil trabalhar sistematicamente com pequenas apostas de baixo risco do que dar uma grande tacada”, diz Ruschel. Claro, existem momentos onde os indícios são irrefutáveis e a chance de sucesso beira os 100%. A última grande oportunidade oferecida no mercado brasileiro, por exemplo, foi exatamente a alta do dólar recente. Mas, mesmo nesses casos, o ideal é não partir para o tudo ou nada. O melhor, segundo ele, é o investidor montar uma posição que gere grandes ganhos no caso de acerto, mas não vá levar a quebra no caso de erro. 

2) Você pode estar certo e ainda assim perder tudo

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Talvez essa seja a principal dicotomia presente na cabeça de um gestor de recursos: fundamentos ou timing? Durante um “bull market” (mercado em tendência de alta) o principal driver não é o fundamento, mas os lucros de curto prazo: enquanto existir dinheiro disponível para pagar mais caro o mercado não para. Na bolha pontocom, por exemplo, era óbvio para muita gente que aquelas empresas não poderiam valer muitos milhões, mas aqueles que venderam cedo demais foram obrigados a fechar a sua posição porque o mercado seguiu a alta por muito tempo antes de reverter.

De uma maneira geral, entre fundamentos e tendência, eu fico com a tendência. Até porque utilizando as técnicas corretas é possível identificar uma mudança da tendência, não o ponto exato de topo ou fundo”, diz Ruschel, que fez carreira utilizando estratégias a partir de análise técnica e métodos quantitativos.

3) Utilize algum tipo de limite de prejuízo

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Outro ponto que todo trader deve ter cuidado é nunca montar uma posição sem saber qual será o prejuízo máximo se as coisas derem errado, diz. E isso pode ser feito de várias formas no mercado. Ou você limita uma parcela máxima do seu capital para uma determinada operação ou um prejuízo máximo permitido, fechando a posição caso o mercado atinja esse limite. É possível também utilizar essas duas estratégias ao mesmo tempo para limitar o risco, explica.

4) É possível ganhar dinheiro tanto nas altas quanto nas baixas

Para Ruschel, uma das melhores lições do filme, quebrando aquela lógica de investidores que correm do mercado quando as ações começam a ir ladeira abaixo. No filme, enquanto a esmagadora maioria dos investidores estava perdendo dinheiro, um grupo de sujeitos conseguiu gerar ganhos com o mercado em queda.

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A venda a descoberto é um instrumento pouco conhecido até mesmo por gestores experientes. Talvez até por ser algo contrário ao espírito otimista que permeia a sociedade na maior parte do tempo ninguém quer saber do que pode dar errado, mas sim do que pode dar certo. Não é por acaso que praticamente todos os gestores retratados no filme eram sujeitos “estranhos”: nerds, pessimistas, exóticos e ranzinzas.

Não que seja preciso ser “estranho” para operar na ponta vendedora, brinca Ruschel. “É só ter os pés no chão e estar aberto aos dois lados do mercado”.

5) Cuidado com o mercado de balcão e derivativos exóticos

No mercado de ações é possível vender a descoberto uma ação com certa facilidade. O mesmo não ocorre em alguns outros mercados. Hoje os CDS’s (credit default swaps) são mais comuns e líquidos, mas ainda fazem parte de um mercado não tão bem regulamentado e organizado, comenta. 

Na época retratada no filme a situação era diferente. Os bancos basicamente tiveram que criar esses produtos, oferecendo um seguro contra a queda, sendo inclusive a contraparte na operação. Uma mistura que costuma não dar certo, diz. Há um conflito de interesse imediato: a corretora ou banco nesse caso só ganha se o cliente perde. E o risco da operação passa a ser o risco da contraparte. Tanto é que no final do filme os investidores quase perdem tudo por conta da insolvência dos bancos que eram em última instância os seus devedores, explica Ruschel. “Nunca opere um instrumento que você não entende completamente e avalie o risco da contraparte”.

6) O mercado financeiro não é o culpado de todos os males da Terra

“Eu assisti todos os filmes e documentários sobre o crash de 2008. Li dezenas de livros. Há quase uma unanimidade em apontar o livre mercado como um problema. Quase todos denunciam as corretoras e bancos como instituições sem nenhum tipo de escrúpulo e a falta de regulamentação desse mesmo mercado por parte dos governos. Obviamente, que o mercado financeiro não é um convento de freiras e existe muita sacanagem por baixo dos panos e relações espúrias entre a indústria e o governo, mas em qual setor não há bandidos e mocinhos?”, questiona.  

O problema, segundo ele, é que, em nenhum momento, esses trabalhos apontaram o dedo para os milhões de indivíduos que tomaram empréstimos que não poderiam pagar e utilizaram o mercado para alavancar as suas posições ou aqueles que compraram esses títulos sem nem saber direito o que eles representavam. Mas será que eles também não teriam responsabilidade? E o lado do governo? Eles também não seriam “culpados” por políticas monetárias frouxas nas últimas décadas que produziram uma bonança artificial? As políticas de subsídio para certos grupos no mercado imobiliário também não tiveram um papel importante para a formação da bolha?

O mercado vive de ciclos de expansão e de correção que não se enquadram numa visão idealista de estabilidade e riqueza duradoura, onde apenas boas intenções garantem as necessidades e desejos de todos. Um certo nível de sofrimento e pressão é necessário para que novos movimentos ocorram. O mesmo mercado que destrói é o mercado que criou essa atual realidade positiva. Coloco isso porque cansei de ver investidores e traders vivenciando um falso conflito entre os lucros das operações e a consciência de estar fazendo “algo errado”. Eu tenho muito orgulho de fazer parte do mercado financeiro. Abomino algumas práticas correntes nesse mercado e dou a minha contribuição para acabar com elas, mas aceito os ciclos de expansão e retração. Vou mais longe, creio que quanto mais livre for o mercado, maior será o nível de riqueza e evolução para todos os seres humanos”, conclui.

Viu o filme e quer deixar a lição que tirou de “A Grande Aposta”? Deixe sua opinião nos comentários da matéria. 

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